Guilherme Fonseca Faro
| Advogado
| Criado: 09 de maio de 2024, 11:58 (enviado ao Migalhas)
| Dados: 29.052024, 18:22.
I - Introdução.
A advocacia desempenha um papel fundamental na administração da justiça e na defesa dos direitos e garantias constitucionais. No entanto, os advogados e advogadas frequentemente enfrentam ameaças, coação e violência no exercício de suas funções, o que compromete a integridade física, moral e patrimonial desses profissionais, bem como a própria efetividade do sistema de justiça. Nesse contexto, surge o Projeto de Lei nº 5154/2023, que visa acrescentar disposições ao Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para assegurar a proteção dos advogados contra essas práticas abusivas.
II - Análise do Projeto de Lei nº 5154/2023.
O Projeto de Lei em questão apresenta aspectos positivos relevantes, como a possibilidade de adoção de medidas protetivas de urgência em favor dos advogados ameaçados ou vitimados, tais como a proibição de contato com o agressor, a restrição de acesso às proximidades do escritório ou residência do profissional, e a prestação de assistência psicológica e jurídica. Ademais, estabelece sanções para o descumprimento dessas medidas, como prisão, detenção ou multa, nos moldes da Lei Maria da Penha.
Contudo, é imprescindível ponderar algumas potenciais fragilidades e desafios na aplicação dessas disposições. A morosidade processual inerente ao sistema judiciário pode dificultar a concessão tempestiva das medidas protetivas, enfraquecendo sua eficácia. Além disso, a comprovação da ocorrência de violência moral ou patrimonial pode ser um obstáculo probatório significativo, dada a natureza subjetiva desses conceitos.
Outro aspecto preocupante é o risco de banalização do uso das medidas protetivas, o que poderia sobrecarregar o Poder Judiciário e desvirtuar o objetivo primordial da lei. Nesse sentido, é crucial que os requisitos para a concessão dessas medidas sejam rigorosamente observados, a fim de evitar a sua aplicação indiscriminada.
III - Irregularidades Processuais e Administrativas: Um Caso Prático.
Um exemplo hipotético, mas não incomum, ilustra a relevância da proteção aos advogados frente a irregularidades cometidas por autoridades públicas. Em uma ação civil pública relacionada a questões ambientais, imagine-se um cenário em que o IBAMA lavra uma multa fraudulenta, o Ministério Público dá prosseguimento a uma denúncia baseada nessa multa viciada, o juiz estadual impede indevidamente o advogado de peticionar nos autos, e, por fim, profere sentença sem garantir o direito à ampla defesa dos réus, mesmo após o envio da defesa via carta precatória.
Nesse cenário, o advogado poderia invocar as disposições do Projeto de Lei nº 5154/2023 e requerer as medidas protetivas cabíveis, especialmente a proibição de contato com as autoridades envolvidas e a assistência jurídica para resguardar seus direitos e o exercício regular da profissão.
IV - O Viés Corporativista do CNMP e CNJ.
Entretanto, é fundamental considerar o viés corporativista presente nos órgãos de fiscalização e regulação do Ministério Público e do Poder Judiciário, respectivamente o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Esses órgãos, criados com o propósito de zelar pela conduta ética e pela eficiência desses atores do sistema de justiça, frequentemente adotam uma postura defensiva e protetiva em relação a procuradores e juízes, dificultando a responsabilização por eventuais desvios de conduta.
Essa tendência corporativista representa um entrave significativo à atuação dos advogados na defesa dos interesses de seus clientes, uma vez que as irregularidades cometidas por autoridades públicas ficam blindadas pela atuação parcial dos órgãos de controle. Nesse contexto, a implementação efetiva do Projeto de Lei nº 5154/2023 torna-se ainda mais crucial, pois visa proteger os advogados justamente contra essa violência institucional.
V - Considerações.
O Projeto de Lei nº 5154/2023 representa um avanço relevante na busca pela proteção dos
advogados e advogadas que enfrentam ameaças, coação ou violência no desempenho de suas atividades profissionais. Contudo, é necessário analisar criticamente os aspectos positivos e as potenciais fragilidades dessa proposta legislativa, bem como abordar o viés corporativista presente nos órgãos de controle do Ministério Público e do Poder Judiciário. Apenas com a implementação efetiva e imparcial das medidas protetivas previstas no Projeto de Lei, somada a uma atuação independente e isenta dos órgãos de fiscalização, será possível garantir a integridade dos advogados e, consequentemente, a efetividade do sistema de justiça como um todo.
Referências.
BRASIL. Projeto de Lei nº 5154, de 2023. Altera a Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994, que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, para incluir disposições sobre a proteção de advogados e advogadas que sofrem ameaça, coação ou violência no exercício da profissão. Câmara dos Deputados, 2023.
ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994.
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